terça-feira, 15 de julho de 2008

Roupa de brincar e roupa de missa

A maioria das coisas eram muito regulamentadas e não mudavam nunca. Era a lei. Quando os novos chegavam logo aprendiam que certas coisas sempre tinham funcionado de um determinado jeito e era assim que deveriam continuar funcionando.

A troca semanal de de roupa era uma delas.

Todo Sábado tinha alguma troca para fazer. A cada duas semanas eram as roupas de cama e as toalhas, e talvez a roupa da escola. Todo Sábado era a roupa de brincar, aquela bermuda e camiseta que nós usávamos todo dia após o horário da escola. Era praticamente a semana toda, todos os dias usando o mesmo par de shorts ou bermuda e camisa ou camiseta. Uma semana usava um par, outra semana usava outro. Assim, duas bermudas boas e umas duas ou 3 camisetas era tudo que nós precisávamos para passar quase metade do ano. Acho que tinha gente que usava os mesmos 2 pares de roupas o ano todo. Bastava ter o cuidado para não rasgar nas muitas brincadeiras animadas, principalmente na parte da noite quando brincávamos de "salve, salve na cadeia".

Essa era muito louca. Como era difícil pegar o Isaac, o Ivan e alguns outros tantos que corriam como loucos por aquele pátio que parecia muito maior que realmente era. Volta e meio aparecia um ou outro sangrando em alguma parte do corpo tal a disposição violente de não se deixar pegar.

Havia também uma roupa de missa que a gente usava na missa dominical e também para ir ao cinema que era outra lei deliciosa de toda semana. Essa roupa de missa e cinema e ocasiões especiais, como era usada muito pouco, durava bem um ano inteiro e às vezes mais.

Para dormir, tínhamos também um pijama que era trocado toda semana. Um par era o suficiente para o ano inteiro.

Essas poucas roupas e mais um sapato e um chinelo de dedo era tudo que a gente precisa para viver a vida sem maiores preocupações. Cabia tudo dentro de uma bolsa pequena e cada peça de roupa tinha um número escrito à caneta tinteiro, obra de grande paciência da dona Judite. Eu me lembro bem do meu número que me acompanhou durante toda a minha vida lá. Outro dia, conversando com o Lúcio, ele me lembrou que o número dele era o 33 e que se lembrava perfeitamente do meu. Só por aí já dá para ver que a memória dele anda muito melhor do que a minha. Por isso, quando alguns de vocês lerem essas lembranças, certamente que vão encontrar uns relatos meio superficiais ou até incorretos. Coisas dessa memória já desgastada pelo tempo. Mas o essencial estará aí.

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