No começo parecia um pequeno detalhe, mas com o passar do tempo, logo a gente acabava se conscientizando de que aquilo era um verdadeiro ritual, algo necessário, algo que tinha que acontecer todos os dias, estivesse frio ou não.
Uma das últimas coisas a se fazer no dia, era a higiene pessoal. Nos tempos mais antigos, houve uma época em que tomar banho completo todo dia não era parte do costume, principalmente porque a água era fria. Mas lavar o rosto, escovar os dentes e lavar os pés era mandatório. Todos tínhamos escova e pasta de dentes, uma toalha de banho, uma de rosto e uma para os pés, uma barra de sabão de côco para o rosto e para o banho e uma barra de um sabão amarelo muito duro e sem cheiro algum. Imagino hoje que talvez fosse uma espécie de sabão bem barato que vinha em barras grandes e toda semana, alguns de nós tinha a missão de dividir as barras grandes em barras menores. Esse era o sabão de lavar os pés. O sabão amarelo. Tivemos uma época que esse sabão amarelo também era usado para lavar as cuecas que ficavam secando durante o dia na certa da horta.
No banheiro comum, relativamente grande, à esquerda ficavam as torneiras para se lavar o rosto e escovar os dentes e as casinhas com os vasos sanitários. À direita ficavam os chuveiros frios e lava-pés que era muito interessante. Nunca mais na minha vida vi um lava-pés como aquele, uma espécie barrado de azulejos brancos e um cano dágua que atravessava de fora a fora, cheio de furos por onde a água fria espirrava. A gente se abaixava, escolhia um daqueles espirros e lavava os pés e as pernas com sabão amarelo. Depois enxugava com a toalha para pés. Essa toalha só servia para enxugar os pés e, como as outras, tinha que ser trocada a cada duas semanas. Imagino o estado da maioria daquelas toalhas ao final das duas semanas. Pobre da dona Olívia e dona Judite, nossas lavadeiras, que tinham dar conta daquilo e preparar tudo limpinho para a próxima semana.
Rosto lavado, dentes escovados, pés lavados, era hora de voltar para a cama e, com sorte, ter ainda algum tempo com as luzes acesas para ler um Gibi. Como a gente lia gibi! Não tenho a mínima idéia de onde vinham, só sei que haviam muitos. Eu gostava muito dos gibis do Homem Aranha, Homem de Ferro, Superman, Superboy, tudo que era super-alguma-coisa. Acho que desde a época já tinha algum complexo de super-herói e foi quando comecei a ter sonhos que podia voar com os braços abertos, não necessariamente como super-homem, mas uma espécie de flutuação bem lenta acima de todos os obstáculos. Até hoje tenho esse tipo de sonho de vez em quando. Eu hein, isso parece coisa para contar para um psiquiatra qualquer dia.
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